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Cotidiano, Crônica, História, Pessoal

Uma carta ao meu psiquiatra

Resolvi te escrever uma carta para conseguir dizer com mais calma tudo que eu tenho sentido e pensado sobre minha condição psicológica. Começo dizendo que estou me sentindo apática. Me sinto à toa pela vida. Onde nada que acontece ao meu redor me atinge. Nem coisas boas e nem coisas ruins. A sensação é que pouco me importa com o que acontece fora, eu só consigo ver o que está acontecendo dentro.

E dentro, estou começando a pensar as mesmas coisas que eu pensava antes de começar o tratamento, lá em fevereiro. Pensando que não tenho vontade de sair da cama, não vendo a hora de o tempo passar para chegar a hora de dormir de novo e não precisar viver. Acordo me lamentando pelas coisas que eu perdi, de um passado já bem remoto.

Meu brilho no olhar não volta. A vontade de ser feliz não volta. Vontade de viver a vida, não volta. 

Me pego todo tempo lendo e fazendo testes na internet para ver se me encaixo no perfil de bipolar tipo 2. Primeiro que existe pouquíssimas informações sobre bipolar tipo 2, segundo que tudo que eu vejo sobre isso realmente não vejo que se encaixa comigo. Nunca tive um episódio de hipomania que durasse mais que uma noite de bebida alcoólica. Nunca passei uma noite sem dormir planejando alguma coisa mirabolante que abandonei de uma hora para outra. Sim, eu tenho hiper foco, por isso sou uma excelente profissional na minha área de atuação, mas isso acontece quando precisa acontecer. Não termino meu trabalho e fico pilhada mais tempo que para execução do mesmo.

Sim, quando cheguei no seu consultório eu estava depressiva. Fazia anos já que me sentia apática. Sem vontade de viver e com pensamentos recorrentes de que a vida não fazia o menor sentido. Mas para isso tudo tinha um motivo. Eu estava passando pelo pior momento e minha vida. Eu tinha motivo para estar assim.

Não foi genético ou uma pré-disposição para a doença psicológica, eram coisas reais. Eram problemas reais. Coisas que tinham e que estavam acontecendo na minha vida. Fui para o fundo do poço. Quando cheguei até você eu já tinha colocado a cabeça para fora do poço, afinal, eu estava ativamente procurando ajuda pra tudo que eu estava passando. Já tinha começado tratamento nutricional, para melhorar minha aparência física e já tinha passado por um Gastro para resolver meu problema no estômago e intestino. Na sua consulta, conseguimos um nome para o que eu tinha, que eu não sabia de onde vinha tanta insatisfação. “Ah, você é bipolar tipo 2 e parecia que tudo tinha se encaixado. Agora eu sei que que eu tenho e tem tratamento. Que alívio. Minha vida pode continuar exatamente de onde está, porque agora o remédio vai resolver essa minha insatisfação”.

Comecei o tratamento e já me senti melhor na primeira semana. Mantive minha rotina de dieta e exercício físico e troquei de terapeuta. Até que bum, falei daquilo que eu não tinha coragem de falar para ninguém. E ela foi na ferida, esmagou a ferida, bateu na ferida e me deixou despedaçada. Cheguei no teu consultório acabado, chorando litros. Precisava me livrar daquele vazio no meu peito. Precisava aliviar aquela ferida, precisava curar aquela ferida. Precisava remexer ela até o fundo, tirar todo pus, eliminar toda infecção.

Então comecei tratamento psicológico e em consonância com o tratamento psiquiátrico. Mas minha vida não volta para os meus olhos, meu olhar não sorri, embora minha boca consiga mostrar os dentes, meus olhos permanecem longe.

“Trechos de uma carta escrita ao meu psiquiatra quando estava em depressão, não é fácil, mas é possível. Depois de mais um ano no tratamento pra Bipolaridade tipo 2, descobri que eu não era Bipolar e começamos um tratamento para Unipolar, que me tirou da depressão.! Eu não desisti. Setembro Amarelo!

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História

O dia que quase fomos atropelados por uma baleia

A história começa em 15 de julho de 2021 em Tijucas, quando nosso barco finalmente iria navegar pela primeira vez. Depois de 4 anos de trabalho árduo, um casamento quase falido e gastando mais que o triplo do orçamento planejado, nosso tão sonhado Catamarã Destino estava pronto para rumar pra Canto Grande, em Bombinhas.

Eram 5 horas da manhã quando ligamos os motores do barco e começamos a passar o Rio dos Bobos que nos levaria a estreia do barco no mar. Adentramos ao oceano Atlântico por volta das 5h30 da manhã com alguns contratempos, um pouco de tensão e muito de emoção. O sol começava a nascer assim que avistamos o horizonte naquele mar calmo e sereno. Começava ali a travessia até o primeiro ancoradouro do Destino Catamarã.

Golfinhos

Chegando em Canto Grande, uma movimentação na água chamou nossa atenção, foi quando o grande presente de aniversário da minha filha iria chegar. Mais de 150 golfinhos nadavam e exibiam sua beleza e esplendor por todos os lados e por baixo do barco, batendo suas nadadeiras na água como que saudando o barco e a Carol pelo seu aniversário. Como tinham sido avistadas muitas baleias na região, brincamos com a Carol que tínhamos contratado baleias para o dia do seu aniversário, mas que Deus tinha enviado no lugar delas, todos esses golfinhos felizes. Foi uma experiência memorável que ficará guardada no coração e na memória por quanto tempo a gente existir.

Até aquele momento estávamos a bordo eu, Ricardo, capitão e meu marido, Carol, nossa pequena filha, que nesse dia completava 6 anos. Mais o Ezequiel e Elizeu, que trabalharam na construção do barco, e que logo ao chegarmos com segurança ao local planejado, se despediram de nós e nos deixaram a desfrutar aquele momento em família.

Passamos três dias em Canto Grande encantados com todas as possiblidades que o barco nos dava e vivendo aquele sonho que planejamos por tantos anos. Tivemos dois dias lindos de sol, recebemos amigos, cantamos parabéns pra Carol na praia com um bolo e dormimos a bordo pela primeira vez na água salgada.

Vento

No 17 de julho começou a bater vento forte, ficamos apreensivos porque era nossa primeira experiência com vento num barco que acabara de sair do galpão a seco e agora fazia o que foi feito para fazer, boiar, resistir a ventos e ondas fortes. Estávamos com um casal de amigos a bordo, Junior e Andressa, que tinham ido passar a noite com a gente.

Dia 18 pela manhã o vento terral batia intensamente e resolvemos procurar abrigo no outro lado da baía. Ao chegar, descobrimos que lá não teria como ficar também, as ondas batiam no fundo do barco e o desconforto do vento foi deixando todos nervosos, menos o capitão, que seguia firme no propósito dele, proteger os tripulantes e o barco.

Com coletes salva vidas em todos a bordo, decidimos passar a ponta de Canto Grande e procurar abrigo na praia da Conceição, que ficava do outro lado da península. O caminho era curto, mas as ondas e o mar agitado, davam um tom de tensão no ar.

Pelo meio do caminho começamos a avistar as baleias, que faziam um show à parte bem à frente, mas com uma distância considerável e segura. Era a primeira vez que víamos baleias estando em uma embarcação no mar. Ficamos encantados, debruçados nas janelas, aguardando o momento que veríamos as baleiras mais de perto. Foi quando, de repente, surge uma baleira Jubarte bem na nossa frente, ela sai da água na proa do barco, nós pudemos ver seus olhos a nos observar e amedrontar. O capitão tirou motor na hora e só aguardou o impacto do barco com aquele animal enorme.

O barco tem aproximadamente 7 toneladas e 12 metros de comprimento. Uma baleia Jubarte tem, em média, 20 metros de comprimento e pesa cerca de 20 toneladas, imagino o estrago que esse encontro daria. Nos preparamos para o impacto e nesses segundos um filme passa na cabeça. O barco vai rachar? vai afundar? a gente vai cair na água? Nosso sonho de 4 anos de luta acaba aqui?

Todos apavorados. Carol e Andressa não tinham mais cor. Ricardo estava arregalado, mas sorrindo, num misto de emoção e tensão. Eu sentia meu coração bater fora do meu corpo. Uma combinação de pavor, medo e ansiedade tomou conta de todos.

A baleia, enorme, calma e ligeira, com metade de seu corpo monstruoso pra fora da água, nos olhou fixamente e sumiu mar abaixo, evitando o impacto que já achávamos que seria inevitável. Que alívio. Nos olhamos incrédulos e se perguntando se aquilo realmente tinha acontecido. Continuamos a percorrer o caminho até a Conceição em silêncio. A baleia nos seguiu ao longe, nadando rápido entre as ondas, mas numa distância que não nos causaria danos, mas se fazendo presença constante até adentramos a baia da praia da Conceição.  

Guardando na memória, cada um de sua forma, o que jamais será esquecido por quem estava a bordo do Destino Catamarã naquele dia 18 de julho de 2021.

Cada um de nós processava o acontecimento de forma diferente. E a seu modo, fazia a prece pelo livramento recebido. Nada tinha acontecido. Deus havia nos salvado? O capitão tinha sido esperto? Ou foi apenas um golpe de sorte de todos nós, inclusive da baleia, que sairia machucada caso o barco se chocasse com ela.  

Chegamos à praia da Conceição, e por não encontrarmos abrigo do vento, resolvemos seguir viagem. Nos despedimos do Junior, Andressa e Carol, que fariam o caminho até Itapema de carro. Eu e o Ricardo resolvemos levar o barco até Porto Belo, onde ficaria ancorado em segurança e de onde seguiríamos para casa.

O dia acabou sem mais delongas, mas com aquelas imagens percorrendo nossa memória. O dia que uma baleia queria nos ver de perto, a gente queria ver ela de perto e o momento desse encontro. Uma enxurrada de emoções que ficarão guardadas na nossa história para sempre.

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